segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

juntar a fome com a vontade de comer

Vem no Diário de Notícias. Discretamente, mas vem. E diz assim: "Bispo defende quem sempre foi pobre".O bispo de que se fala é Januário Torgal, bispo das Forças Armadas, que na mensagem de Natal deste ano terá dito mais ou menos isto, que é necessário haver um recato em aludir ao viver acima das possibilidades; porque há um mundo de portugueses e portuguesas que nunca as tiveram... o DN remata a breve notícia escrevendo que o bispo Januário Torgal pede o exercício de comportamentos limpos, sem  conveniências nem interesses para defender os princípios que regem a dignidade da pessoa.Mas recuemos até ali onde se lê que há um mundo de portugueses e portuguesas que nunca as tiveram... Ora, nunca as tiveram, o quê?... As possibilidades, ou a possibilidade de viver acima das possibilidades? O que não é a mesma coisa...
Diz o bispo que é preciso algum recato em aludir ao viver acima das possibilidades, porque há um mundo de portuguesas e portugueses que nunca as tiveram...  e isso é verdade tanto para os que o bispo quer proteger, ou seja, os que sempre foram pobres – como se diz no título -  como para  os outros, os que vivem acima das suas próprias possibilidades. A única diferença é que a uns ainda se lhe reconheceu alguma capacidade de endividamento e por isso se lhes concedeu o crédito, que lhes permitiu viver acima das suas reais possibilidades... A outros esse crédito não foi reconhecido, nem concedido... e assim sendo, temos agora , entre os pobres...  os que sempre foram pobres.. os que nunca conseguiram quem lhes fiasse nem uma carcaça... e os outros, a quem os bancos e outras instituições de crédito deram quase tudo sem fazer perguntas. Os primeiros continuam pobres e são esses que o bispo quer proteger em nome da dignidade humana   e temos depois os outros, que, sem nunca terem realmente saído da pobreza, estão hoje ainda mais pobres, já que ninguém lhes empresta mais dinheiro e o que têm de mais certo e seguro é o cobrador do fraque a bater-lhes à porta.
Quem estará realmente em piores lençóis?...
Os que nunca saíram da cepa torta, como se diz, ou os que, depois de terem conhecido o Paraíso, se vêem agora recambiados para o Inferno...?

E na edição de hoje, o Público entrevista Rui Miguel Nabeiro, administrador da Delta cafés. Em título à entrevista, o jornal cita o próprio empresário, que acha que  “não resolvemos o problema da economia tornando as leis laborais mais flexíveis”. Diz ainda , já em sub título – que o que distingue as economias são os talentos e gente capaz de acrescentar valor.
Entretanto e em caixinha de texto, selecionada pelo próprio jornal, temos esta outra declaração de Rui Miguel Nabeiro: “preocupa-me que as pessoas estejam assustadas. Assustadas compram menos.”Ora aí está!   Ora aí está o velho adágio... que não há bela sem senão. Ou seja, se é verdade que as pessoas assustadas compram menos, é também verdade que, assustadas, é mais fácil levá-las a
suportar todos os sacrifícios, sobressaltos e até sevícias. Assustadas é mais fácil.
Muito mais fácil.
É quase como juntar a fome com a vontade de comer!


(Nota da Redacção - a fotografia dos burros não tem outra razão senão a vontade inexplicada do autor em publicar hoje uma fotografia de burros. só isso.)

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